sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

QUINDINS NA PORTARIA - Martha Medeiros






Estava lendo o novo livro do Paulo Hecker Filho, Fidelidades, onde, numa de suas prosas poéticas, ele conta que, antigamente, deixava bilhetes, livros e quindins na portaria do prédio de Mário Quintana: "Para estar ao lado sem pesar com a presença".   Há outras histórias e poemas interessantes no livro, mas me detive nesta frase porque não pesar aos outros com nossa presença é um raro estalo de sensibilidade.
 
Para a maioria das pessoas, isso que chamo de um raro estalo de sensibilidade tem outro nome: frescura.
 
Afinal, todo mundo gosta de carinho, todo mundo quer ser visitado, ninguém pesa com sua presença num mundo já tão individualista e solitário.
Ah, pesa. Até mesmo uma relação íntima exige certos cuidados.
 
Eu bato na porta antes de entrar no quarto das minhas filhas e na de meu próprio quarto, se sei que está ocupado.
Eu pergunto para minha mãe se ela está livre antes de prosseguir com uma conversa por telefone.
Eu não faço visitas inesperadas a ninguém, a não ser em caso de urgência, mas até minhas urgências tive a sorte de que fossem delicadas.
Pessoas não ficam sentadas em seus sofás aguardando a chegada do Messias, o que dirá a do vizinho.
Pessoas estão jantando.
Pessoas estão preocupadas.
Pessoas estão com o seu blusão preferido, aquele meio sujo e rasgado, que elas só usam quando ninguém está vendo.
Pessoas estão chorando.
Pessoas estão assistindo a seu programa de tevê favorito.
Pessoas estão se amando.
Avise que está a caminho. Frescura, jura? Então tá, frescura, que seja.
Adoro e-mails justamente porque são sempre bem-vindos, e posso retribuí-los, sabendo que nada interromperei do lado de lá.
Sem falar que encurtam o caminho para a intimidade.
Dizemos pelo computador coisas que, face a face, seriam mais trabalhosas.
Por não ser ao vivo, perde o caráter afetivo?
Nem se discute que o encontro é sagrado.
Mas é possível estar ao lado de quem a gente gosta por outros meios.
Quando leio um livro indicado por uma amiga, fico mais próxima dela.
Quando mando flores, vou junto com o cartão.
Já visitei um pequeno lugarejo só para sentir o impacto que uma pessoa querida havia sentido, anos antes.  Também é estar junto.
Sendo assim, bilhetes, e-mails, livros e quindins na portaria não é distância: é só um outro tipo de abraço.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Um presente para uma pessoa especial


Caixinha, com dois sabonetes com técnica de decoupage

Vamos servir petiscos?


            Bandeja Petisqueira

Para presentear


Caixa por dentro

Uma linda caixa de presente


Caixa forrada com tecido e técnica de decoupagem.

Guardando relíquias


Baú com técnica medieval

Uma delicadeza


Cômoda porta bijouteria

Feitos com carinho

Uma linda cesta lilás


A segunda cesta com as lembrancinhas de sabonetes da minha sobrinha

Uma linda cesta branca


Cesta com lembrancinhas de sabonetes
Fiz para o aniversário se quinze anos da minha sobrinha

domingo, 15 de janeiro de 2012

Ode ao Gato - Arthur da Tavola






Bichos polêmicos sem o querer, porque sábios, mas inquietantes, talvez por isso. Nada é mais incômodo que o silencioso bastar-se dos gatos. O só pedir a quem amam. O só amar a quem os merece.
O homem quer o bicho espojado, submisso, cheio de súplica, temor, reverência, obediência. O gato não satisfaz as necessidades doentias do amor. Só as saudáveis.

Lembrei, então, de dizer, dos gatos, o que a observação de alguns anos me deu. Quem sabe, talvez, ocorra o milagre de iluminar um coração a eles fechado? Quem sabe, entendendo-os melhor, estabelece-se um grau de compreensão, uma possibilidade de luz e vida onde há ódio e temor? Quem sabe São Francisco de Assis não está por trás do Mago Merlin, soprando-me o artigo?

Já viu gato amestrado, de chapeuzinho ridículo, obedecendo às ordens de um pilantra que vive às custas dele? Não! Até o bondoso elefante veste saiote e dança a valsa no circo. O leal cachorro no fundo compreende as agruras do dono e faz a gentileza de ganhar a vida por ele. O leão e o tigre se amesquinham na jaula. Gato não. Ele só aceita uma relação de independência e afeto. E como não cede ao homem, mesmo quando dele é dependente, é chamado de arrogante, egoísta, safado, espertalhão ou falso.

"Falso", porque não aceita a nossa falsidade com ele e só admite afeto com troca e respeito pela individualidade. O gato não gosta de alguém porque precisa gostar para se sentir melhor. Ele gosta pelo amor que lhe é próprio, que é dele e ele o dá se quiser.

O gato devolve ao homem a exata medida da relação que dele parte. Sábio, é espelho.
O gato é zen. O gato é Tao. Ele conhece o segredo da não-ação que não é inação.
Nada pede a quem não o quer.

Exigente com quem ama, mas só depois de muito certificar-se.
Não pede amor, mas se lhe dá, então ele exige.

Sim, o gato não pede amor. Nem depende dele. Mas, quando o sente,é capaz de amar muito. Discretamente, porém sem derramar-se. O gato é um italiano educado na Inglaterra. Sente como um italiano mas se comporta como um lorde inglês.

Quem não se relaciona bem com o próprio inconsciente não transa o gato. Ele aparece, então, como ameaça, porque representa essa relação precária do homem com o (próprio) mistério. O gato não se relaciona com a aparência do homem. Ele vê além, por dentro e pelo avesso. Relaciona-se com a essência. Se o gesto de carinho é medroso ou substitui inaceitáveis (mas existentes) impulsos secretos de agressão, o gato sabe. E se defende do afago. A relação dele é com o que está oculto, guardado, e nem nós queremos, sabemos ou podemos ver. Por isso, quando surge nele um ato de entrega, de subida no colo ou manifestação de afeto, é algo muito verdadeiro, que não pode ser desdenhado. É um gesto de confiança que honra quem o recebe, pois significa um julgamento.

O homem não sabe ver o gato, mas o gato sabe ver o homem. Se há desarmonia real ou latente, o gato sente. Se há solidão, ele sabe e atenua como pode (ele que enfrenta a própria solidão de maneira muito mais valente que nós). Se há pessoas agressivas em torno ou carregadas de maus fluidos, ele se afasta. Nada diz, não reclama. Afasta-se. Quem não o sabe "ler" pensa que ele não está ali. Presente ou ausente, ele ensina e manifesta algo. Perto ou longe, olhando ou fingindo não ver, ele está comunicando códigos que nem sempre (ou quase nunca) sabemos traduzir.

O gato vê mais e vê dentro e além de nós. Relaciona-se com fluidos, auras, fantasmas amigos e opressores. O gato é médium, bruxo, alquimista e parapsicólogo. É uma chance de meditação permanente a nosso lado, a ensinar paciência, atenção, silêncio e mistério. O gato é um monge portátil à disposição de quem o saiba perceber.

Monge, sim, refinado, silencioso, meditativo e sábio monge, a nos devolver as perguntas medrosas, esperando que encontremos o caminho na sua busca, em vez de o querer preparado, já conhecido e trilhado. O gato sempre responde com uma nova questão, remetendo-nos à pesquisa permanente do real, à busca incessante, à certeza de que cada segundo contém a possibilidade de criatividade e de novas inter-relações, infinitas, entre as coisas.

O gato é uma lição diária de afeto verdadeiro e fiel. Suas manifestações são íntimas e profundas. Exigem recolhimento, entrega, atenção. Desatentos não agradam os gatos. Bulhosos os irritam. Tudo o que precise de promoção ou explicação, quer afirmação. Vive do verdadeiro e não se ilude com aparências. Ninguém em toda natureza aprendeu a bastar-se (até na higiene) a si mesmo como o gato!

Lição de sono e de musculação, o gato nos ensina todas as posições de respiração ioga. Ensina a dormir com entrega total e diluição recuperante no Cosmos. Ensina a espreguiçar-se com a massagem mais completa em todos os músculos, preparando-os para a ação imediata. Se os preparadores físicos aprendessem o aquecimento do gato, os jogadores reservas não levariam tanto tempo (quase 15 minutos) se aquecendo para entrar em campo. O gato sai do sono para o máximo de ação, tensão e elasticidade num segundo. Conhece o desempenho preciso e milimétrico de cada parte do seu corpo, o qual ama e preserva como a um templo.

Lição de saúde sexual e sensualidade.
Lição de envolvimento amoroso com dedicação integral de vários dias.
Lição de organização familiar e de definição de espaço próprio e território pessoal.
Lição de anatomia, equilíbrio, desempenho muscular.
Lição de salto.
Lição de silêncio.
Lição de descanso.
Lição de introversão.
Lição de contato com o mistério, com o escuro, com a sombra.
Lição de religiosidade sem ícones.
Lição de alimentação e requinte.
Lição de bom gosto e senso de oportunidade.
Lição de vida, enfim, a mais completa, diária, silenciosa, educada, sem cobranças, sem veemências, sem exigências.
O gato é uma chance de interiorização e sabedoria posta pelo mistério à disposição do homem.